terça-feira, 11 de dezembro de 2007

A Memória Curta de FHC

Hoje, terça-feira, 11 de dezembro de 2007, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, mais uma vez, resolve apagar o seu passado, reeditando sua prática de quando assumiu a Presidência da República, do “esqueçam o que eu disse”. Mas algumas pessoas preferem não esquecer.

Segundo Fernando Henrique Cardoso, falando sobre as discussões acerca da CPMF, “O governo foi arrogante quando chamou todos que são contra de sonegadores. Eu nunca fiz isso, nunca xinguei ninguém. Não precisa ficar desesperado.".

Talvez FHC tenha razão sobre Lula. Lula pode ser considerado extremamente arrogante, desde o seu tratamento aos demais setores dos movimentos populares, ainda nos tempos de sindicalista, até a forma como trata os setores populares hoje, ou mesmo alguma oposição de esquerda. Mas com certeza, a arrogância não foi a marca das declarações de Lula em relação à CPMF, pois os sonegadores efetivamente se mobilizaram contra a contribuição. Mas sequer esse é o ponto que merece nossa abordagem.

Fernando Henrique Cardoso disse que jamais “xingou ninguém”, que “não precisa ficar desesperado”, que “nunca fiz isso”. Essa memória seletiva do líder tucano parece muito conveniente às vezes, mas a memória do povo é um pouco melhor do que isso.

Mas se FHC jamais xingou alguém, gostaria de saber o que foram suas palavras ao afirmar que “pessoas que se aposentam com menos de 50 anos são vagabundos, que se locupletam de um país de pobres e miseráveis”, em maio de 1998. E cabe lembrar que tal referência aos aposentados não acontecia pela primeira vez naquela ocasião.

Da mesma forma, os adjetivos utilizados por FHC para se referir a movimentos populares, funcionários públicos que reivindicavam reajustes salariais ou condições dignas de trabalho, não eram mais elogiosas do que isso. Ou mesmo seus atos, ao tratar uma greve de petroleiros como caso militar, destruindo sua federação e combatendo trabalhadores com o exército, não é senão um xingamento por meio de atos.

Será que FHC realmente acredita que a memória de todos é tão curta quanto a sua, ou estaria apenas a testar a tese de Goebels, da mentira repetida mil vezes?

Oposição Boliviana Com Medo da Democracia

A oposição boliviana, mais uma vez, mostra sua face ditatorial e o seu medo da vontade popular, em atitudes golpistas, ilegais e antidemocráticas.

Com a instalação da Assembléia Nacional Constituinte na Bolívia, a oposição rapidamente se mobilizou para buscar todos os meios de barrá-la. A oposição, que em toda a história boliviana dirigiu o país, teme o fim dos seus privilégios e do controle absoluto que os grandes grupos econômicos mantêm sobre o país.

Entretanto, sob forte mobilização popular, o MAS, partido do presidente Evo Morales, obteve maioria absoluta dos assentos na constituinte, ainda engrossada sua maioria com os aliados. A oposição, concentrada na UM (União Nacional), no Podemos (Poder Democrático Social) e outras organizações de menor peso, foi obrigada a contentar-se com menos de um terço das cadeiras na constituinte.

Em razão da esmagadora maioria de constituintes ligados aos movimentos populares que conduzem o processo de transformações na Bolívia, a oposição se viu sem alternativas para manter o poder real, o controle econômico e os privilégios de antes. Além disso, a falta de justificativas para apresentar à população para sua oposição às transformações, fez a oposição partir para estratégias evasivas e busca elementos de divisão da sociedade, como a questão da definição da capital do país.

No entanto, o principal ponto de ataque à proposta de constituição, que seria a questão da reeleição, caiu por terra, com a aprovação do texto que permite uma única reeleição ao presidente, em termos iguais a maioria das democracias do mundo.

A questão da capitalidade, como questão infinitamente menor, não foi capaz de provocar mobilizações de grande envergadura em todo o país, apenas servindo à incitação à violência promovida contra os constituintes em Sucre, com o objetivo de inviabilizar o funcionamento da Assembléia e a aprovação do texto constitucional dentro do prazo.

Agora, com a aprovação da Constituição Política do Estado, como é chamada, a oposição passa a fazer uso de estratégias descaradamente golpistas e antidemocráticas.

O texto constitucional, para entrar em vigor, ainda depende da aprovação popular, num exercício extremo de democracia, pois na maioria dos países a simples aprovação pela constituinte já seria suficiente para sua promulgação. Mas a oposição sabe que o texto constitucional conta com apoio massivo da população, sendo sua aprovação no referendo tida como certa. De tal forma, os governadores de oposição, da chamada “meia-lua ampliada”, tentam jogar na divisão do país, com uso de violência e uma declaração de independência de seus departamentos.

Para entender qual é a indignação da oposição e de seus governadores, é necessário compreender minimamente a realidade boliviana.

A Bolívia é um Estado Unitário, em que o governo central concentrava todos os poderes. Os governadores dos departamentos, até 2005, eram nomeados pela Presidência da República, sendo que nesse 2005, pela primeira vez na história, foram eleitos. Mas essa concentração de poderes, esse modelo de Estado Unitário, nunca foi problema para esses grupos que hoje são oposição, enquanto os mesmos estiveram no controle do governo central e a reivindicação de autonomia era das populações indígenas, maioria da população do país concentrada nas áreas com menor atendimento e destinação de recursos do governo central.

Esses governos departamentais, apesar de eleitos, não possuem legislativos regionais ou departamentais, tendo todo o poder concentrado no governador.

A Constituição aprovada confere a autonomia tão desejada historicamente pelo povo, como também contempla a autonomia departamental. O texto dá autonomia aos departamentos, inclusive criando seus tribunais e legislativos, como faz o mesmo com as populações indígenas.

Mas a oposição discorda desses termos. Os governadores rejeitam a criação de legislativos departamentais, pretendendo exercer os poderes sozinhos, sem qualquer controle ou representação plural. Também rejeitam a autonomia dos povos indígenas, não aceitando dar-lhes qualquer tipo de direito a mais do que já possuíam anteriormente. Ainda, os governadores querem que a autonomia financeira e territorial dos departamentos passe a ser total e absoluta. Outro ponto que sofre a contestação é a destinação de recursos para uma espécie de bônus aos idosos, que os governadores querem que sejam destinados aos departamentos para seus gastos livres.

Em resumo, os governadores desejam exercer sozinhos um poder absoluto em departamentos completamente autônomos, sem qualquer direito para as populações indígenas ou benefícios aos idosos.

Com esses anseios absolutamente autoritários e antidemocráticos, os governadores da chamada “meia-lua ampliada”, composta pelos departamentos de Santa Cruz, Pando, Beni, Tarija e Cochabamba, estão a combater radicalmente qualquer possibilidade de permitir que o povo boliviano decida sobre a constituição. Com isso rejeitam o referendo e tentam impedir o voto popular.

Tendo a certeza da derrota nas urnas, os governadores buscam não só impedir o referendo constituinte, como também buscam todos os artifícios possíveis para fugir ao referendo que poderá revogar mandatos do presidente e governadores, que anteriormente os mesmos governadores diziam aceitar.

Nesse caminho autoritário, os governadores da “meia-lua” já convocaram as Forças Armadas para um golpe de Estado, o que foi rejeitado enfaticamente pelos militares, que disseram defender as instituições, a democracia e a legalidade.

Agora partem para uma última tentativa golpista, com a ameaça de declararem, unilateralmente, a autonomia e independência de seus departamentos, já rejeitada em referendo popular no ano passado.

Evidentemente, tal ruptura institucional não será tolerada pelo Estado e pelo povo, o que deixará a Bolívia em situação de extrema convulsão social.

É uma tentativa de golpe absolutista em curso, que poderá iniciar uma série de conflitos sem precedentes na história boliviana. E tal tentativa, certamente, terá como resposta grandes enfrentamentos, talvez até maiores do que aqueles que iniciaram esse período de mudanças que se consolida com a nova Constituição.

Uma Chance para a Paz

A Colômbia jamais esteve tão perto e, ao mesmo tempo, tão distante de uma amenização do sofrimento causado por esses mais de 40 anos de conflito, ou mesmo do início de um processo de paz.

O necessário Acordo Humanitário esteve muito próximo de um êxito, sob a mediação de Chavez e Piedad Córdoba, que poria fim ao longo sofrimento de tantas pessoas e tantas famílias de ambos os lados. Ainda que não seja possível, nesse momento, repatriar aqueles seqüestrados pelo governo colombiano e enviados, ao arrepio da lei, para os EUA, o retorno dos 45 prisioneiros em poder das FARC e dos 500 prisioneiros em poder do governo Uribe, aos seus lares, às suas famílias, às suas vidas, seria um imensurável alívio ao sofrimento do povo colombiano.

Porém, as oligarquias colombianas e os interesses estadunidenses continuam mantendo sua política de busca por soluções militares, de massacre de toda e qualquer resistência popular aos seus interesses e de manutenção do controle e da presença militar estadunidense na América Latina e na região amazônica, mesmo contra todo o povo colombiano.

Uribe, ao perceber que a continuação das negociações para o acordo humanitário caminhava a passos largos, logo tratou de por obstáculos às negociações, como a inflexibilidade em permitir reuniões com o principal dirigente das FARC, Manuel Marulanda, ou suas sucessivas recusas em sentar-se à mesa de negociações. Mesmo assim as negociações avançavam, com inúmeras concessões por parte das FARC, dentro daquilo que era possível sem comprometer a segurança da guerrilha e dos prisioneiros.

Diante de tal realidade, Uribe tomou a única atitude que lhe era possível para sabotar as negociações para o Acordo Humanitário que, em questão de dias, chegaria em situação irreversível.

É importante lembrar que mesmo o início das negociações só ocorreu graças à forte pressão internacional, tão reivindicada pelas FARC, liderada por Venezuela, Suécia, Suíça, França, Espanha, entre tantos outros países e organizações das mais diversas.

Nesse cenário, diante de olhos atentos daquilo que se convencionou chamar de “Comunidade Internacional”, Uribe não poderia falhar, tendo tentado a melho encenação de boa vontade que lhe era possível. E assim buscou, desesperadamente, impedir qualquer possibilidade de Acordo Humanitário enquanto ainda era possível impedi-lo, já que em pouco tempo se tornaria inevitável, em razão do avançados das negociações.

Porém a reação dos familiares dos prisioneiros em poder das FARC não era esperada por Uribe. Da mesma forma, a reação dos países que apóiam a realização do Acordo Humanitário, mobilizados em torno dos sucessivos apelos das FARC, deixou o governo colombiano em situação difícil, não podendo evitar qualquer negociação, sendo obrigado a construir artifícios e desculpas esfarrapadas para o encerramento das negociações mediadas por Chavez e Córdoba. E a partir daí, seguiu-se nova pressão, dessa vez até mais organizada, construindo-se um verdadeiro bloco de países em defesa do Acordo Humanitário e da paz na Colômbia.

As FARC aplaudem e comemoram as pressões que podem por fim a parte significativa do sofrimento do povo colombiano. E com essa realidade a paz ganha nova chance de realizar-se na Colômbia.

Nessa segunda-feira, quase todo o bloco de países em busca da pz na Colômbia esteve reunida, tendo Uribe em meio ao principal assunto, na posse de Cristina Kirchner, o que pode ser um fato marcante para o futuro dos processos de negociação.

Uribe ainda não cedeu em sua ânsia belicista e sanguinária, sempre a serviço de interesses estadunidenses. Mas a pressão crescente, agora de países com o prestígio internacional de França, Brasil e Espanha, além da Argentina que entrou nas discussões pelas mãos do marido da prisioneira Ingrid Betancourt, dá novos contornos à situação.

Certamente, Uribe não poderá utilizar mais suas velha estratégias escapistas, nem buscar desmoralizar os facilitadores das negociações.

Com isso, a paz na Colômbia ganha nova chance, ou mesmo alguma alívio ao sofrimento de todo aquele povo, mesmo que a paz não avance de forma significativa.

Com certeza é a última chance de Uribe fazer algo de positivo em relação a esse conflito interno. E espera-se que não caia novamente em tentação de seguir cegamente as ordens vindas da Casa Branca, exterminando as esperanças da população tão sofrida de seu país.

A realidade presente mostra que, se as lágrimas derramadas pelos familiares dos mais de 70 mil mortos fora de combate pelos militares colombianos e estadunidenses na Colômbia nos últimos anos não comovem os oligarcas e o presidente daquele país, a pressão internacional faz às vezes de impulsionadora de um processo de negociação. Se não é por um sentimento humano, pelo senso humanitário que a Colômbia entrará em um sério processo de negociação, será pela necessidade daquela oligarquia em manter as aparências frente à comunidade internacional.

É uma esperança aos que choram mais de 300 mil mortos. É uma esperança aos que choram mais de 70 mil mortos fora de combates apenas nos últimos anos. É uma esperança a todas essas vítimas do terrorismo de Estado imposto por sucessivos governos controlados pelo narcotráfico. É uma esperança às inúmeras famílias e aos prisioneiros dessa guerra de poderem voltar às suas vidas.

As FARC desejam a paz. A Colômbia precisa da paz.