sábado, 29 de março de 2008

Curitiba 315 anos: o que comemorar?

Ontem, minha querida e amada Curitiba completou seus 315 anos.

Eu passei apressado pelo local da comemoração oficial, desviando da fila que aguardava por um pedaço de bolo, observando, apesar da pressa, os detalhes daquela cena.

A partir da cena do ato oficial de comemoração, fiquei pensando sobre o que comemorar nessa data.

Nas filas gigantescas, à espera de um pedaço de bolo, eu vi pessoas de razoável aparência, com vestimentas razoáveis, feições não muito sofridas. Mas ao redor da fila, vi mães maltrapilhas, estampando o cansaço e o sofrimento nas faces, enquanto seguravam seus filhos de colo nos braços, numa cena desoladora. Ao redor, crianças com roupas sujas e rasgadas, olhando para tudo com um ar de perplexidade. Traço comum e marcante naquelas mães e crianças, era o olhar faminto com que fitavam os pedaços de bolo nas mãos dos outros.

Não sei se por ato de alguma autoridade, ou se apenas por um sentimento de exclusão provocado pela presença de autoridades e “gente tão fina”, mas eles simplesmente não tomaram parte na festa, não tendo direito sequer a um pedaço daquele bolo. Talvez depois que os outros comeram tudo o que queriam, tenha sobrado algo para esses curitibanos de “segunda classe”.

Nas extremidades da praça, sede da primeira universidade do país, alguns carrinheiros, apoiados em seu instrumento de trabalho, olhavam para a cena como se a não compreendessem. E realmente, acredito, não a compreendiam.

Nas escadarias da universidade, cercada por equipamentos de iluminação e de som, além de tendas, um coral de crianças entoava algumas músicas que eu jamais tinha ouvido. E ao mesmo tempo, um locutor com um som muitas vezes mais potente que o das crianças, anunciava que eram alunos de escolas municipais, ao mesmo tempo em que anunciava os 315 “gloriosos” anos dessa cidade.

As crianças, apesar das músicas que eu jamais ouvira, até que cantavam bem. Mas ninguém estava a lhes dar a mínima atenção.

O que pude notar, é que para aqueles carrinheiros, para aquelas mães pobres, para aquelas crianças que nem sabiam que podiam comer o bolo, não havia o que comemorar. Aquelas crianças correndo, apesar da vontade de comer, apenas não procuravam seu pedaço de bolo, pelo hábito de não terem direito a nada, de saberem que pedir algo para comer era um ato reprovável.

E aquelas crianças que cantavam. Elas estavam ali apenas para simbolizar a participação do povo da periferia. E o fizeram muito bem, pois por mais que cantassem, ninguém lhes dava atenção, assim como fazem com o seu povo, que por mais que gritem, não são ouvidos efetivamente por ninguém.

O que estavam a comemorar? Será que comemoravam o fato de os moradores da Vila Audi terem conseguido preparar sua sopa de papelão por mais essa noite? Ou estavam a festejar o povo das moradias Barigüi que esperam por uma creche? Ou seria a falta de escola no Tatuquara?

Seria talvez a comemoração dos trabalhadores da empresa municipal de urbanização, por seus salários próximos ao mínimo, enquanto assistem alguns de seus chefes receberem até 16 mil mensais para gastarem seu horário de trabalho no salão de beleza? Ou seriam os 45 concursados da companhia de desenvolvimento, por seus mais de 200 chefes comissionados com altos salários?

Talvez fosse a comemoração daquele assessor do meu prefeito do PSDB comemorando o salário de sua sogra, funcionária fantasma da Assembléia Legislativa, cujos rendimentos somaram mais de 500 mil reais, que ele prometeu repor, com um dinheiro que poucos sabem, mas sairá dos cofres públicos também.

Será que naquela praça estava Dalton Trevisan, para tão melhor mal dizer aquela festa da hipocrisia?

Talvez fosse o prefeito a comemorar o fim do circuito de bares alternativos, dos ambientes culturais populares, do boteco de meia dose, ao tempo em que florescem os recantos da elite, da juventude alienada.

Não sei ao certo. Mas sei que, diante da visível miséria de meu povo, do massacre contra a cultura de minha cidade, da repressão às expressões populares, da falta de comida na mesa de meus irmãos, do superfaturamento de obras, das profundas desigualdades sociais e dos meus irmãos que ocupam ares irregulares apenas esperando quando a guarda municipal irá despejá-los com o uso das armas, pouco ou nada pude comemorar.

O que comemoravam eles então?

terça-feira, 25 de março de 2008

PCB: 86 anos de história na luta pelos trabalhadores

O PCB, o nosso Partidão, comemora no dia 25 de março 86 anos de luta revolucionária pelo socialismo. O poeta Ferreira Gullar escreveu uma vez que quem quiser contar a história dos brasileiros e de seus heróis tem que falar do Partido Comunista Brasileiro (PCB), ou estará mentindo. Fundado em 1922, o PCB comemora, no próximo dia 25 de março, 86 anos de existência, atuando como organização clandestina ou legal. Conhecido há décadas como “Partidão”, o PCB é o partido mais antigo em atuação no país, e um dos mais antigos do mundo.

Qual a razão dessa longevidade político-institucional? Como explicar a duração e a resistência dos comunistas ao longo do século XX e XXI, depois de tantas perseguições, inclusive com o assassinato de sua cúpula dirigente, nos anos da ditadura militar, e do fim da União Soviética e do socialismo real? Uma parte da explicação talvez esteja no fato de os comunistas do PCB constituírem um tipo de político que olha a prática e a teoria da política como uma dimensão do ideal de igualdade que, em sua visão, deve reger as relações entre os seres humanos.

Há uma espécie de fé ou de crença nessa dimensão, mas se trata de uma fé, por assim dizer, científica. Em uma época na qual muitos partidos são siglas de aluguel, os políticos são, em geral, vistos como interessados no poder para amealhar riqueza e fama, e a opinião pública, em sua maioria, rebaixa a atividade política em função do predomínio do mau político, os pecebistas sobrevivem acreditando na política como elemento de elevação do homem como ser coletivo.

Trata-se de uma visão generosa em uma época de forte relativismo na moral e na política. Para além da visão científica e dialética que informa sua teoria do capital, do trabalho e da política, os comunistas do PCB buscam praticar o que pensam – o que é significativo, dado que o espírito republicano requer a educação da cidadania pela ética do fazer e pensar a política.

Esta visão parece ser uma marca institucional do PCB ao longo dessas oito décadas e meia. Mas não é fruto do acaso. Há muita reflexão teórica que, conjugada com a prática em face dos desafios políticos, sociais e econômicos de cada época, renova aquele pensar e fazer a política como uma dimensão do coletivo.
Não queremos dizer que os comunistas do PCB são melhores. Houve erros de avaliação política, análises distorcidas e ingênuas do quadro social brasileiro, e as concepções idealistas sobre o caráter da revolução brasileira nos anos 60, no qual as teses do partido postulavam um papel de alinhamento da burguesia nacional na luta dos trabalhadores.
A longevidade do PCB pode ser explicada justamente em aprender com os erros próprios e alheios, como ensina a dialética marxista que baliza sua reflexão. O partido não abdicou de sua visão socialista e revolucionária da sociedade e da política nem quando um grupo conservador, nos anos 90, tentou extingui-lo e se apropriar da sigla, além da foice e martelo simbolizando a aliança entre o trabalhador do campo e da cidade.

Depois de 86 anos, o PCB, que teve entre os seus fundadores o pernambucano Cristiano Cordeiro, não tem hoje expressão eleitoral no Brasil. Mas não será por isso que se transformará em um coadjuvante das lutas políticas e sociais do povo brasileiro. Jamais morre um partido que acredita na política e no ser humano como meio e fim para a conquista de uma sociedade justa, baseada na democracia substantiva.

segunda-feira, 24 de março de 2008

As FARC política e as políticas das FARC – parte II

Como movimento de resistência, as FARC já traziam em sua origem o acúmulo de experiência da antiga resistência popular com participação liberal, que alcançou não apenas seu objetivo inicial de garantir a vida, mas também algumas conquistas, ainda que pontuais e transitórias, inimagináveis antes de tal movimentação.

Diante desse quadro, as FARC-EP, em sua formação extremamente plural, pôde analisar aspectos mais amplos para traçar objetivos não apenas táticos, mas estratégicos para a guerrilha, que agora não se via isolada em apenas uma região do país, num movimento defensivo. Essa nova organização, agora presente em todo o território nacional, contando com todo um leque de experiências da antiga resistência armada, que se somava às experiências de lutas de diversos movimentos sociais cujos líderes acabaram por se integrar à guerrilha, mais a experiência de atuação e organização política dos comunistas, agora podia vislumbrar a possibilidade de uma tomada popular do poder.

Tal realidade provocou extrema preocupação à elite dirigente do país, que viu-se, pela primeira vez na história, acuada pelas possibilidades de um amplo movimento popular que rompia com o monopólio da violência. E a guerrilha também provocou extrema preocupação aos Estados Unidos, que acabara de ver um movimento popular em armas tomar o poder em Cuba, ao lado de seu território.

A plena vigência da guerra fria, o recente êxito da revolução cubana, aliado ao extremo desespero das classes populares colombianas que agora se transformava, com a mesma intensidade, em esperança, acabou por jogar uma responsabilidade de grande monta sobre as FARC e seus dirigentes políticos, que se viram na posição central do conflito de classes e de interesses na Colômbia. Tal responsabilidade acabou por obrigar as FARC a buscar um intenso processo de elaboração política e formação de quadros, além da formação cultural e política intensa de todos os seus integrantes.

No entanto, a forte reação de extrema violência do Estado colombiano, dos paramilitares, dos traficantes que começavam a ganhar cada vez mais poder, agora somados à ação direta de tropas estadunidenses, levou as FARC a enfrentar novos desafios.

No aspecto militar, o desafio das FARC era o enfrentamento de um inimigo que a cada dia ganhava em força e ampliava a brutalidade de suas ações, não apenas contra a guerrilha, mas também contra as populações civis pobres, tidas como inimigos centrais desde sempre pela oligarquia colombiana. Além desse aspecto, a questão de domínio territorial mínimo se tornava um desafio, vez que se tornava imperativo para o desenvolvimento da luta uma ação de fincasse raízes políticas junto às populações nas áreas mais abrangestes possíveis, o que de certa forma restringia a tradicional forma de atuação extremamente móvel dos movimentos guerrilheiros.

Ao mesmo tempo, com a intensificação da ação terrorista do Estado e das forças para-estatais, a guerrilha via-se obrigada a lidar com um problema inusitado, que era a crescente procura de populares por integrar-se à guerrilha, após verem seus familiares e amigos assassinados pelo Estado, pelos traficantes, por forças estrangeiras, ou simplesmente serem desterrados pela “reforma agrárias às avessas”.

Nesse caso, o desafio era tanto o de garantir treinamento militar adequado aos novos integrantes, para não tornarem-se alvos fáceis para o inimigo, como também o de garantir a firmeza ideológica e moral do movimento, para não permitir desvirtuamentos ou problemas que afetassem negativamente o convívio entre os militantes, ou com as populações civis com as quais conviviam.

Nesse sentido, a guerrilha acaba por organizar-se numa estrutura militar hierarquizada, que no tocante ao cotidiano da luta armada acaba por adotar uma linha de rígida disciplina. No entanto, como uma organização eminentemente política e popular, acaba por construir uma estrutura política altamente participativa e democrática, na qual o auge acabou por ser as Conferências, realizadas de forma periódica e alcançando a participação de cada um dos membros da organização.

Ainda restava a ação política da organização fora das fronteiras das regiões de embates militares, que não deveria acontecer apenas pela atuação política do Partido Comunista. E assim as FARC passam a diversificar suas formas de atuação, inclusive mantendo dirigentes populares que buscava a guerrilha em suas lutas populares originais, ou mesmo buscando o intercâmbio com organizações populares e até deslocando muitos de seus militantes.

Com o desenvolvimento da luta, tanto no campo político quanto militar, torna-se cada vez mais necessário o desenvolvimento político da guerrilha, que agora já contava com quadros preparados, nos mais diversos níveis e nas mais diversas regiões do país. E assim a elaboração de políticas públicas da organização, além do desenvolvimento teórico e prático, em termos políticos, organizacionais e culturais, ganha cada vez mais destaque.

Nesse momento, a atuação da guerrilha ganha destaque, passando, apesar da forte atuação militar do estado, dos paras e dos EUA, a controlar grandes regiões do país, tendo sob seu controle, ainda que precário, inteiras cidades, onde torna-se necessário o desenvolvimento de políticas públicas.

Ao lado disso, as proporções numéricas da organização, a presença de famílias inteiras sob a organização da guerrilha, também leva à necessidade de uma infinidade de serviços, organização, questões que vão desde a educação e garantia de saúde, até os elementos mais básicos de sobrevivência, no que as FARC vão se tornando uma organização cada vez mais complexa.

Com as crescentes necessidades ao longo do tempo, além do papel quase que substitutivo do Estado em inteiras regiões, as FARC acabam por ver-se obrigadas a partir para a execução de tarefas anteriormente não previstas para o decorrer da luta, incluindo elementos que vão desde a cobrança de tributos, até a prestação de serviços básicos às populações.

Nesse período, o amadurecimento político constante da guerrilha e dos demais movimentos populares, além do próprio Partido Comunista, levam a luta a uma intensificação cada vez maior de seu papel político, que vai das lutas pontuais e conjunturais dos trabalhadores, inclusive em questões meramente econômicas, até lutas institucionais e mesmo a amplificação das relações internacionais.

No que se refere às relações internacionais, no entanto, a guerrilha passa a enfrentar seu maior desafio, visto a criminalização da organização pelos veículos de comunicação, através de um discurso unilateral do governo colombiano e dos EUA, que as vinculava aos cartéis de tráfico de drogas, que na verdade sempre combateram as FARC ao lado de soldados estadunidenses e colombianos. Entretanto, em diversos momentos, tal discurso perdeu força, com a vinda à tona de diversas vinculações dos chefes do tráfico de drogas com os governantes e com o Estado colombiano, o mesmo que combatia as FARC. Destaca-se, nesse aspecto, a forte ascendência e a alternância no poder dos dois maiores cartéis de drogas do país, o Cartel de Calli e o Cartel de Medellín.

Com o crescimento constante da guerrilha, as perspectivas de sucesso da luta tornam-se cada vez mais claras. No entanto, torna-se também clara a necessidade da vitória no campo político, visto não ser possível estabelecer uma vitória real, naquela conjuntura, apenas através das armas, ainda que sustentados por um amplo movimento popular com a participação direta e massiva das FARC. Ao mesmo tempo, a elite colombiana faz leituras diversas acerca da crescente disposição e pressão das FARC para garantir-se da transposição da luta armada para uma luta eminentemente política. Tais leituras vão desde uma análise de enfraquecimento da guerrilha, que já não ofereceria riscos reais no campo político, razão pela qual se deveria permitir sua institucionalização, até a análise de que seria mais fácil combatê-los, inclusive no campo militar, se eles estivessem atuando de forma aberta e institucionalizada.
(continua ...)

domingo, 23 de março de 2008

Um novo Paraguai está nascendo


Falta menos de um mês para o nascimento de um novo Paraguai, um novo país em que a democracia prevaleça, em que a voz popular possa ecoar e ser ouvida.

Há mais de 60 anos, o mesmo grupo político vem dirigindo o país. E não estamos aqui a falar em “mesmo grupo político” apenas no sentido de grupo de defesa dos mesmos interesses, como ocorre em quase toda a América Latina, mas de “mesmo grupo político” em sentido literal, numa espécie de apropriação absoluta do poder político de forma privada. Estamos falando do controle absoluto do Partido Colorado, tradicional representante dos setores mais conservadores do Paraguai. E é essa a realidade que atormenta aquele povo.

Não é preciso falar muito sobre o Paraguai para demonstrar a profunda tragédia social em que aquele país está mergulhado desde tempos imemoráveis. Não é necessário, portanto, dizer o quão nefasta é essa hegemonia política absoluta dessa oligarquia política colorada no Estado paraguaio.

É bem verdade que a tragédia social paraguaia tem raízes bem mais remotas, que nós brasileiros deveríamos melhor lembrar e conhecer, visto sermos dos maiores responsáveis. Estamos aqui falando do “Massacre do Paraguai”, erroneamente chamado em nossas terras de “Guerra do Paraguai”.

Apenas como rápida lembrança cabe apontar que tal massacre foi encabeçado pelo Brasil, sob as ordens da coroa britânica, contando com o apoio das armas de Argentina e Uruguai. Foi das maiores atrocidades da história até então, praticada por nossas forças armadas, no século retrasado, contra o país com economia e organização sócio-política mais avançada do continente.

Dessa chamada guerra, declarada sem razão pelo Brasil e aliados, sob ordens britânicas, sobra-nos a glorificação do banditismo facínora de Duque de Caxias, responsável pela política de extermínio de todos os paraguaios do sexo masculino, independente da idade, mesmo os recém nascidos ou nascituros, com o objetivo de dizimar aquela nação, impedindo-os de se perpetuar. E o responsável pelos massacres de homens, idosos, crianças, bebês e mulheres grávidas, como estratégia de extermínio, é ainda hoje o patrono de nossas forças armadas e dá nome a ruas, avenidas e tantas outras homenagens inimagináveis a qualquer um com um mínimo de bom senso.

Por outro lado, daquele criminoso episódio, restou aos paraguaios, donos do país mais desenvolvido do continente à época, o seu país arrasado, destruído, reduzido a escombros e sem sequer população suficiente para reconstruí-lo ou garantir a sobrevivência e reprodução daquele povo. Responsabilidade nossa, dos brasileiros.

A terra arrasada é sempre um lugar fértil para a proliferação do banditismo social, da corrupção, da opressão e das imensas desigualdades sociais. É comum nessas situações, o surgimento de pequenos grupos de indivíduos com visão individualista ao extremo, que inclusive buscam o apoio do agressor para ganhar em poder sobre o povo, destacando-se como dominante internamente e perpetuando a opressão, o massacre de seu povo. Essa história já vimos em tantos países ao longo da história, que nem mesmo é possível lembrar quantos.

E assim se deu com a história do Paraguai, que após a mais atroz agressão sofrida, viu-se dominado por uma reduzidíssima elite econômica e política, altamente opressora e ditatorial, extremamente subserviente a interesses estrangeiros.

Desde aquele momento, essa elite econômica e política foi aprimorando seus mecanismos de dominação e opressão, chegando ao modelo ditatorial sob organização partidária colorada, que dá as cartas no país de forma absoluta, abusando de expedientes violentos e criminosos. Não à toa, o Paraguai viu-se nos últimos tempos com presidentes assassinados, presos, depostos, envolvidos com crimes comuns, tráfico, roubo, assassinatos, dentre inúmeros outros crimes.

Foi sob tais práticas criminosas que o país vizinho viu um sem número de seus populares obrigados ao exílio, que para muitos já dura mais de 20 ou 30 anos, sem mais qualquer perspectiva de retorno. E foi sob esse regime que vimos o Paraguai submetendo-se de forma desavergonhada aos interesses estrangeiros, notadamente dos Estados Unidos e, subsidiariamente, do Brasil, que também atua de forma imperialista naquele país.

Trata-se, hoje, de um país que permite a instalação de uma base militar estadunidense, justamente em um dos pontos estratégicos para controle sobre o Aqüífero Guarani, maior fonte de água doce subterrânea do planeta. É o país que se deixou dominar pelo Brasil na construção da maior usina hidrelétrica do mundo, Itaipu, em que se viu destituído de sua soberania, obrigado a ceder o controle de suas águas e sua produção energética ao Brasil, para o qual é obrigado a vender, exclusivamente, sua energia por menos da metade dos preços de mercado ou os praticados no Brasil.

Nem só do controle por Estados estrangeiros padece o Paraguai, mas também pelo controle econômico estrangeiro privado, notadamente na questão agrária.

É o Paraguai um dos países de maior concentração agrária do planeta, com reflexos profundos na desigualdade social e mesmo no desenvolvimento econômico do país. Não fosse esse um grave problema por si só, some-se o fato de que o controle das grandes porções de terras agricultáveis do país sequer está em mãos dessa pequena elite econômica e política do país, sendo controlada, em verdade, pela mesma elite agrária brasileira, ou alguns de seus sócios.

Tal situação de absoluto controle privado brasileiro sobre as regiões agrárias do Paraguai leva aquele país à absurda situação de sequer ver internamente os recursos oriundos das culturas ali exercidas, não tendo sequer essa produção negociada em moeda paraguaia ou via sistema financeiro daquele país.

Temos então que as terras que lá produzem, com grandes extensões territoriais, acabam tendo sua produção comercializada através do Brasil ou exterior, com a movimentação financeira respectiva ocorrendo no sistema bancário brasileiro, sem que os recursos cheguem sequer a transitar pelo Paraguai, não rendendo divisas para o país, nem mesmo arrecadação concreta para os cofres públicos, em resumo, não gerando qualquer riqueza para o país. A esse país vizinho sobra tão somente o subemprego de bóias frias ou trabalhadores rurais não regulares, além dos camponeses desterrados, pelos mesmos métodos de pistolagem e grilagem que produziram as grandes concentrações agrárias no Brasil. Nem mesmo os poucos empregos qualificados no setor podem ser ocupados pelos paraguaios, que vêm tais vagas ocupadas exclusivamente por brasileiros ou outros estrangeiros, numa clara prática imperialista e de ocupação de uma parte de nossa elite econômica naquele país.

Somente esses elementos já explicariam a situação de absoluto caos social daquele país, sua miséria profunda e o extremo atraso sócio-econômico. Mas muitos outros elementos podemos acrescentar à lista, inclusive aqueles expedientes tradicionalíssimos para a manutenção e expansão do controle político sobre um povo, tais como a extrema deficiência educacional com altas taxas de analfabetismo, a fome endêmica que submete populações inteiras à necessidade de amparo social paternalista, o coronelismo, violência institucional, dentre tantos outros males que afetam gravemente aquela população.

Durante todos esses anos, sobretudo nos últimos 60 anos, mesmo no período mais intenso de lutas populares, entre as décadas de 1960 e 1980, coincidente com as lutas contra ditaduras em todo o continente, o povo paraguaio jamais esteve tão próximo de ver-se construindo um processo de libertação, como está agora.

A esperança do povo paraguaio surge com a entrada na vida política de um Bispo católico, ou seja, um representante de uma das instituições que, ao longo da história, mais ajudaram a legitimar o regime opressivo e repressivo naquele país.

Fernando Lugo é mais um paraguaio que nasceu de forma comum, em meio a uma realidade comum em seu tempo, ou mesmo nos tempos atuais, que não viram grandes evoluções sociais naquelas terras.

Um garoto pobre, nascido em uma família pobre e de forte tradição católica, do humilde município de San Pedro del Paraná, que muito cedo ingressa na vida religiosa, no Seminário dos Missionários do Verbo Divino.

Tendo atuado no Equador, como missionário, logo após seu aprofundamento de estudos voltou ao Paraguai, como Bispo na região mais pobre do país, onde voltou a ter contato com a realidade que lhe era tão familiar, da pobreza, da miséria, da exploração e da opressão.

Para um homem que não se deixa levar pelos encantos da riqueza, ou pela sedução do individualismo, tal experiência de vida, desde a infância pobre, até sua atuação em comunidades carentes, só poderia resultar no florescimento de uma consciência política de caracteres populares, movidos pelo amor ao próximo, o que levou Lugo a optar, mesmo a contragosto de Roma, pela Teologia da Libertação.

Se tal opção, em países como o Brasil já leva a uma atuação social intensa, no Paraguai, sob uma crise social muito mais profunda, com uma classe política altamente corrompida e um Estado altamente repressor, as necessidades de atuação política e social de Lugo tornaram-se muito mais amplificadas. E foi essa a realidade que permitiu o ressurgimento da esperança daquele povo.

Em 2006, Lugo veio a ser um dos principais líderes dos movimentos populares contra as políticas entreguistas, neoliberais e corruptas de Nicanor Duarte, transformando-se em uma das mais importantes vozes dos povos oprimidos daquele país. E foi pelo clamor popular que o caminho de Lugo passou a ser guiado, até que em 2007 deixou seu cargo de Bispo da igreja católica para dedicar-se à candidatura presidencial, submetendo-se à exigência que vinha do povo, das ruas.

Diante de sua candidatura presidencial, lançada pelo povo, a reação da oligarquia paraguaia foi imediata, tendo os setores conservadores e liberais buscando todos os recursos para impedi-la, até mesmo lançando mão do não reconhecimento do caráter laico do Estado paraguaio, afirmando que seu desligamento da igreja católica, exigência legal para possibilitar a candidatura de Lugo, não seria válido, visto que a igreja não reconhecia o direito de um Bispo desligar-se da igreja.

Outra marcante estratégia da oligarquia paraguaia para impedir uma possível vitória de Lugo nas eleições, foi a absolvição e a libertação do ex-presidente Lino Oviedo, responsável por massacres, magnicídio de Luís Maria Argaña, duas tentativas de golpe de Estado, dentre outras. A manobra se deu em razão de supostos dados de pesquisas e projeções, que avaliavam a penetração de Oviedo entre o mesmo eleitorado de Lugo.

Entretanto, apesar de todas as tentativas desesperadas da oligarquia paraguaia, há menos de um mês das eleições no Paraguai, Fernando Lugo aparece em primeiro lugar nas pesquisas, mais de 10 pontos à frente do segundo colocado.

É cada vez mais marcante na campanha de Lugo a forte mobilização popular, levada a cabo por uma ampla coalizão de forças que incluem quase a totalidade de movimentos populares, sindicais, sociais e traz desde o Partido Comunista Paraguaio, até o Partido Liberal Radical Autêntico, além de outros partidos de esquerda e centro e o movimento Tekojoja, do próprio Lugo.

Marcante também é o grande apelo popular de Lugo junto aos setores progressistas de outros cantos do mundo, que acompanham a realidade paraguaia, em clara demonstração de sua importância como elemento de esperança para o início de alguma mudança da dramática realidade social do país. Destaca-se, nesse aspecto, o explícito apoio do Governo do Estado do Paraná, em cuja fronteira extensa com o Paraguai se localiza a usina de Itaipu. Tal apoio, inclusive tem levado à participação direta do Secretário de Comunicação do estado na campanha de Lugo, que até o momento tem todas as características de crescimento contínuo, com uma larga dianteira.

Hoje, mais do que nunca, a sensação é de que o fim de uma tragédia, a tragédia social paraguaia, está próxima de seu fim. E parece muito próximo o nascimento de uma nova nação, agora livre e soberana, justa e com possibilidade de construção de um futuro digno.

Está prestes a nascer um novo Paraguai.

Invasões, Pontal do Paranapanema e MST


A região do Pontal do Paranapanema há muito se tornou o símbolo máximo da criminalidade no campo, da conivência das autoridades que não fazem cumprir a lei de forma adequada e dos meios de comunicação que silenciam diante de tantos crimes conhecidos por todos.

Naquela região as invasões tornaram-se a regra, não mais a exceção. E isso já tem tanto tempo que já nem é mais possível determinar quando começou. A lei, o direito, conceitos de civilidade e organização social simplesmente parecem não existir. E a situação alcança níveis de tão elevado absurdo, que os criminosos, aqueles que confrontam a lei de forma direta, passaram a ser apontados como os “mocinhos”, enquanto aqueles que simplesmente exigem o cumprimento da lei, a vigência do nosso Estado de Direito, passaram a ser criminalizados.

Hoje, após a vigésima ocupação de terras promovida pelo MST apenas neste ano, essa situação fica ainda mais evidenciada.

Talvez ao leitor mais desatento, ou menos informado, a impressão dada até aqui seja o exato oposto do que se está a demonstrar. A realidade de desrespeito absoluto da lei se dá justamente por aqueles que hoje, com extremo acesso à imprensa, clamam por justiça, mesmo sem por ela estarem amparados.

A região do Pontal do Paranapanema não é apenas mais uma, dentre tantas outras, de grandes concentrações agrárias, frontalmente contrárias ao estabelecido em nossa Constituição de 1988. Trata-se de uma região em que praticamente não existem propriedades rurais privadas, sendo a quase totalidade das terras de propriedade do Estado brasileiro, as chamadas Terras Devolutas.

São terras que jamais pertenceram a ninguém, portanto definidas como propriedade da União, mas que sempre foram cultivadas, em geral por famílias ou pequenos grupos sociais ao longo da história, em uma região extremamente fértil.

Por tais características, é uma região que chama a atenção de qualquer um que pretenda produzir no campo em larga escala, ou mesmo apenas especular com terras de grande capacidade produtiva. Evidente que terras com tais características chamaram a atenção daqueles mesmos que, por meio da pistolagem e outros expedientes nada aceitáveis em termos morais ou legais, construíram as grandes concentrações de terras no Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Norte do Paraná, Sul de São Paulo, dentre outras regiões. E assim se deu.

A região de terras públicas altamente agricultáveis foi ocupada por titulares de grandes fortunas, que hoje se arrogam na posição de donos das terras. E o fizeram por meio das armas, do terror ou pressão.

Terras que, nos termos de nossa legislação, nos termos dos princípios constitucionais vigentes, deveriam servir à Reforma Agrária ou ao desenvolvimento do país por meio da pesquisa ou outros projetos, são hoje ocupadas, invadidas, por grandes latifundiários, inclusive mantendo grande parte dessas terras na absoluta improdutividade.

Diante de tal realidade de mais absoluto desrespeito à lei, é justamente o movimento acusado pela grande imprensa e setores conservadores como infrator da lei, a buscar as atenções e a ação do Estado como garantidor de nossas normas, de nosso Estado de direito: o MST.

Curiosamente, ao invés de denunciar a grilagem de terras públicas, a grande mídia que se diz independente acusa aqueles que fazem a denúncia devida e exigem a aplicação da lei, como se fossem os verdadeiros criminosos. E ao mesmo tempo, é essa a mídia que aplaude os governos quando esse decidem, ao invés de fazer a reforma agrária prevista em nossa constituição, doar essas terras públicas aos latifundiários que as grilaram, nas chamadas “regularizações de propriedade de terras devolutas”.

Parece que a própria UDR, entidade dedicada à organização de milícias terroristas que assassinam líderes camponeses já deu a solução, ainda que sem querer, para a solução desse longo conflito agrário: a aplicação da lei. Não a lei com que está acostumada nossa elite rural, que só se aplica contra pobres, camponeses, trabalhadores rurais, mas a lei de verdade, aplicada de forma imparcial, com a restituição de todas as terras públicas à União e sua conseqüente destinação legalmente prevista, prioritariamente à reforma agrária.

É mais do que hora de acabar com a criminalidade no campo, quase sempre cometida pelo grande latifúndio. É mais do que hora de acabar com a grilagem de terras, executada quase sempre por grandes proprietários, que agora está em vias de ser mais uma vez incentivada, com a “regularização” mais um bloco de terras fruto da grilagem na região do Pontal do Paranapanema. É mais do que hora de eliminar a pistolagem e seus troféus, consistentes na posse das terras públicas ou privadas conquistadas sobre o sangue de famílias de pequenos produtores.

Que se respeite a lei: faça-se a reforma agrária.

sábado, 22 de março de 2008

Um lacaio em busca de legitimação

Uribe segue a receita de confronto de Bush



Nada como um dia depois do outro: a reunião do Grupo do Rio, ocorrida na República Dominicana, em 07 de março, afastou o risco de guerra e evitou a ampliação de uma crise na América Latina, desencadeada pela violação das fronteiras do Equador por tropas colombianas em uma operação que resultou no massacre de um grupo das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) e a morte de seu interlocutor internacional, o comandante Raul Reyes. A Organização dos Estados Americanos já havia condenado, dois dias antes, a agressão ao Equador, considerada “um desrespeito às leis internacionais”. Solidificam-se, desta forma, os governos do Equador e da Venezuela, cujos processos de desenvolvimento com justiça social e ampla participação da população vem ocorrendo nestes dois países, assim como a Bolívia.

Uribe isolou-se: além da maior parte dos veículos de imprensa burguesa, o presidente colombiano só encontrou guarida na Casa Branca. Até mesmo o presidente do México, Felipe Calderón (eleito em um
processo evidentemente fraudulento, e que só conseguiu assumir a presidência por pressão do departamento de Estado dos EUA) condenou a ação colombiana.

Mas o que quer Uribe? A guerra. Sua resistência à abertura de diálogo com as FARC na Colômbia pode trazer como resultado a internacionalização do conflito. Uribe se tornou um fator de instabilidade na América Latina, ao manter a política de confronto. Para manter seu projeto de poder – submisso, diga-se com todas as letras a verdade, aos EUA – Uribe não pode recuar desta estratégia pois ele se legitimou politicamente como o homem que resolveria a guerra civil. E, sem guerra civil, não haveria como justificar a presença militar norte-americana na Colômbia, a manutenção da censura à imprensa, a exclusão social e o poder das oligarquias colombianas. Tampouco haveria condições políticas para Uribe pleitear um terceiro mandato, já mencionado, no Congresso, no bojo de um processo de discussão,
em curso, sobre a possibilidade de reformar-se a Constituição do país.

A iniciativa das FARC de liberar reféns unilateralmente vai contra este projeto, num claro e pacífico aceno ao diálogo institucional. Quem não quer esse diálogo? Quem fez de tudo para que a operação de soltura dos reféns terminasse em fracasso? Quem dificulta as condições para a libertação de Ingrid Bettancourt, que, uma vez solta, poderia se candidatar à presidência da Colômbia com índices elevados de popularidade? A resposta é simples e direta: Uribe, representante das oligarquias e dos interesses
dos EUA.

A agressão ao Equador e às FARC foi uma clara provocação contra o intercâmbio humanitário e contra a possibilidade de paz na região. Uribe agrediu, num só ato, as FARC, o Equador e a Venezuela. Agrediu toda a América Latina, todos os que lutam por paz e justiça social.

A resposta dos povos

Mas não se consegue enganar a muitos por muito tempo: no ultimo dia 06 de março, milhares de pessoas se manifestaram em homenagem às vítimas dos crimes de Estado que imperam na Colômbia e contra a invasão do Equador por tropas deste país. As ruas de Bogotá estavam repletas. Estes milhares de manifestantes disseram claramente que desejam a paz. Desejam a inversão de um quadro de extrema violência que se instalou na Colômbia.

Entre 1982 e 2005, milhões de pessoas foram deslocadas de suas casas e de suas cidades pelo exército colombiano e pelas milícias de direita que o apóiam. Há milhares de colombianos desaparecidos, entre os quais se incluem índios, sindicalistas, parlamentares de esquerda, membros da União Patriótica. Muitos foram torturados antes de morrer. Recentemente, foi assassinado, em território venezuelano, um dirigente
da Juventude Comunista da Colômbia, a JUCO.

Há que relembrar-se que, neste período, mais de 6 milhões de hectares foram tomados dos camponeses. Muitos grupos armados de direita mantiveram-se ativos mesmo depois de sua desmobilização oficial, em 2002 (chamam-se, agora, “águias negras”). Muitos representantes destes grupos estão em cargos públicos.

A população colombiana e internacional desconhecia estes fatos até recentemente, dada a forte censura à
imprensa exercida pelo governo sobre os meios de comunicação daquele país. Mas o tiro de Uribe saiu pela culatra: a mobilização popular e a movimentação dos governos progressistas da América Latina vão isolar cada vez mais o regime fascista colombiano, abrindo caminho para a paz, o diálogo e o desenvolvimento com justiça social na Colômbia.

sábado, 15 de março de 2008

As FARC política e as políticas das FARC – parte I

Nos últimos tempos, sobretudo em razão de trágicos acontecimentos, muito se tem falado a respeito do conflito colombiano e das FARC. Entretanto, interessante aspecto dessa abordagem é a mais completa ausência de uma análise histórica, ou mesmo de assimilação dos conceitos e percepções de origem popular sobre o tema. De tal forma, cumpre dar alguma contribuição, ainda que bastante rasa, tendo em vista a profundidade que o tema exige.

É comum, aos detratores da guerrilha colombiana, apontá-las como um grupo terrorista, criminoso, essencialmente militarista e completamente desvinculado do povo ou das lutas populares. E isso é um erro que só se sustenta em razão dessa completa falta de abordagem histórica da guerrilha.

Outra acusação comum é oriunda de setores ditos democráticos, de que as FARC, ou seriam criminosas e terroristas, ou de que se perderam em razão de sua limitação ao militarismo em essência, tendo que seu objetivo teria se transformado em apenas manter sua própria estrutura.

Poderíamos questionar tais teses a partir da análise das fontes de dados e informações que as sustentam. Podemos apontar que tais elementos são assim postos fora da Colômbia, ou nos grandes centros urbanos de predominância de uma classe média típica, que representa menos de 20% da população do país. E poderíamos apontar que as fontes de tais versões são plenamente identificáveis, basicamente em dois grandes veículos de informação, a Revista Semana, crítica aberta de todos os movimentos populares colombianos e do jornal El Tiempo, sob controle econômico de Francisco Santos, vice-presidente colombiano. Entretanto, deixaremos isso para um segundo plano, pois que a simples verificação da realidade histórica já nos basta à análise.

Sobre a essencialidade puramente militar da guerrilha, cabe lembrar sua origem, seu nascimento, na região de Marquetélia, há 44 anos atrás.

Desde 1946, sob o governo de Mariano Ospina Pérez, a Colômbia viveu sob um regime de puro terror, com os massacres cotidianos de trabalhadores e camponeses, de todos os militantes liberais e comunistas. Foi um tempo em que qualquer voz que denunciasse os crimes era calada definitivamente, como foi o caso de Jorge Eliecer Gaitán, o mais célebre combatente contra a política terrorista de então, brutalmente assassinado pelo regime.

Nesse período, dominado fundamentalmente pela ingerência de grupos econômicos privados estrangeiros nas áreas urbanas, enquanto dominavam os grupos de grandes latifundiários conservadores na área rural, foi marcante para toda a história posterior da Colômbia.

O domínio pleno, sem lei, de grandes latifundiários conservadores na zona rural, levou não apenas à violência habitual em situações de mesmo tipo, mas também à trágica experiência da “reforma agrária às avessas”, em que os pequenos proprietários e camponeses eram expulsos de suas terras à força, ou em caso de resistência eram assassinados com toda a família, tendo suas terras anexadas às grandes propriedades de então.

Foi nesse cenário que se formou uma aliança inusitada, fruto da necessidade urgente, do desespero popular, entre os comunistas e os liberais, para organizar a resistência popular, em defesa da vida desses camponeses e de suas pequenas propriedades de que necessitavam para a sobrevivência.

Tal aliança, evidentemente, teve grande força, conquistando inúmeras vitórias populares para a época, que hoje, no mundo dito democrático se diriam fundamentais. Mas as possibilidades de tal movimento estavam muito além dessas pequenas conquistas. Porém conquistas maiores não eram interessantes nem mesmo aos liberais.

Em 1953, com um golpe de Estado que levou Gustavo Rojas Pinilla ao poder, surge a promessa de pacificação do país, com a garantia de anistia, oportunamente aproveitada pelos líderes liberais de então. No entanto, grande parte dos liberais não aceitaram participar desse movimento, mesmo sem vislumbrar a manutenção da luta por meio das armas. Esse grupo se organiza na região de Marquetália e inicia um processo de desenvolvimento econômico agrário extremamente bem sucedido, com a participação, ainda que minoritária, também dos comunistas.

Em meados da década de 1960, essa experiência da região de Marquetália, que atingia um grau extremamente elevado de desenvolvimento agrário e econômico, em um modelo completamente diverso da tradicional propriedade, torna-se uma ameaça aos interesses dos conservadores e dos líderes liberais, que respondiam diretamente a grandes grupos financeiros, além dos interesses privados estadunidenses na região, garantidos por seu governo.

Nessa situação, volta a intensificar-se a violência paramilitar e militar contra os camponeses da região, só que agora já completamente abandonados pelos liberais, que deixaram os camponeses a eles ligados completamente abandonados.

Na rabeira da intensificação da violência, viu-se também a volta da política sistemática de “reforma agrária às avessas”, com o êxodo forçado de milhares de camponeses da região. Só que agora, como resultado da experiência de resistência anterior, os ataques aos camponeses deixam de ser tão fáceis.

Diante do completo abandono dos liberais à causa, são os comunistas que tomam a frente da resistência, tendo Marulanda, antigo líder camponês liberal, agora já nas fileiras do Partido Comunista, organizando, junto com outros 47 líderes camponeses, a resistência à violência estatal e paraestatal.

Tendo a resistência organizada, torna-se imperativo para os interesses dos conservadores, dos liberais e dos estadunidenses, o completo extermínio da mesma, no que em 1964 organizam uma missão de 16 mil soldados, bombardeios e todo tipo de forças paramilitares, com o único objetivo de exterminar os 48 líderes camponeses da região.

Nesse episódio de 1964, a resistência, ainda que sem uma vitória territorial clara, obtém uma significativa vitória ao frustrar, por absoluto, o objetivo do ataque, que era o extermínio da resistência. E o fizeram, dentre outras coisas, pelo levante em armas, na forma de guerrilha rural, que acabou por iniciar a vida e a história das FARC-EP, movimento que acabou por se espalhar por todo o território colombiano, sob sustentação dos comunistas, com a adesão de camponeses e trabalhadores de todo o país, vítimas do terrorismo de Estado e dos paramilitares, tendo adotado sua forma de organização e seu nome após a reunião de todas as frentes guerrilheiras, também na região de Marquetália.

Tal origem das FARC, sua forma de organização, de nascimento, aliada à sua composição popular, de pronto impedem qualquer possibilidade de entendê-la como organização essencialmente militar, pois é popular em sua raiz, em seu nascedouro, em sua formação real.

(continua...)

quinta-feira, 13 de março de 2008

Marcha pela paz na Colômbia - Bogotá

La Jornada / Tradução Naila Freitas - Agência Carta Maior


CONTRA A VIOLÊNCIA DE ESTADO


Mais de 200 mil marcham contra Uribe na Colômbia




Jorge Enrique Botero - La Jornada


Em repudio às matanças perpetradas pelos paramilitares, milhares de colombianos protestaram contra o governo de Álvaro Uribe. Multidão chamou presidente de "lacaio imperialista". Jovens enfrentaram a polícia no fim do protesto. Pelo menos dez ficaram feridos.
BOGOTÁ - Como um rio furioso cujas águas tivessem estado represadas por anos, a maior multidão vista nos últimos tempos saiu às ruas de 21 cidades colombianas, no dia 6 de maço, para render tributo às vítimas dos paramilitares e de crimes de Estado.

Nesta capital, pelo menos 200 mil pessoas caminharam pela central Carrera Séptima rumo à Praça de Bolívar, que ficou cheia pelo menos três vezes ao longo de quase cinco horas, durante as quais os manifestantes lançaram duras críticas ao governo do presidente Álvaro Uribe.

As marchas que tinham sido qualificadas por altos funcionários governamentais como “de apoio à guerrilha”, foram uma verdadeira avalanche humana em que a maioria dos manifestantes acusou Uribe de ser aliado dos grupos paramilitares de extrema direita.

“Vamos à rua, derrubar o governo paramilitar”, gritavam centenas de estudantes da Universidade Nacional, enquanto milhares de trabalhadores de empresas estatais acusavam o mandatário colombiano de “fascista, lacaio imperialista”.

Organizadas pelo Movimento Nacional de Vítimas dos Crimes de Estado, as marchas tomaram um rumo inesperado quando os participantes se pronunciaram sobre os mais recentes acontecimentos políticos, incluída a crise diplomática com o Equador e a Venezuela. Inclusive, numerosos manifestantes marcharam ao grito de “Chávez sim, Uribe não”, no meio dos aplausos do grande público que se lotava cada lado da principal avenida da capital colombiana.

Jaime Caicedo, vereador de Bogotá pelo Pólo Democrático (esquerda) disse para La Jornada que a massiva mobilização era uma contundente resposta à idéia vendida pela mídia de que Uribe conta com o apoio majoritário dos colombianos. “Parece que os pesquisadores nunca perguntaram a opinião destas centenas de milhares de colombianos”, ironizou.

No cair da tarde, quando a manifestação na Praça de Bolívar já estava se dissolvendo, centenas de jovens tiveram um enfrentamento com a polícia, que literalmente tinha ocupado o centro da cidade. Os fatos derivaram para uma verdadeira batalha campal que deixou um saldo de pelo menos 10 feridos, vultosos danos em locais bancários e comerciais, e um número indeterminado de detidos.

Um dos organizadores da homenagem às vítimas, Iván Cepeda, filho do senador comunista Manuel Cepeda, assassinado em 1992, confessou para este correspondente que a magnitude da marcha superou suas expectativas e explicou que participaram, além de órfãos e viuvas, milhares de camponeses expulsos de suas terras pelas ações dos grupos paramilitares.

De acordo com cifras de organismos especializados, mais de quatro milhões de pessoas foram vítimas do êxodo forçado após centenas de massacres perpetrados pelos paramilitares. Atualmente, mais de 60 congressistas que apoiaram a eleição de Uribe estão presos ou são investigados por seus vínculos com os esquadrões da morte.

Cepeda acrescentou que também houve homenagens às vítimas dos paramilitares e dos crimes de estado em 150 cidades dos cinco continentes.

La Jornada entrevistou, também, um grupo de jovens associados ao movimento “Filhos e Filhas”. Alejandra Gaviria, cujo pai foi assassinado no início dos anos 80 na cidade de Medellín, disse que não permitirá que este crime seja esquecido. Explicou que até agora o assassinato de seu pai está impune. “Por isso, um dos nossos lemas é: nem perdão nem esquecimento, castigo para os assassinos”.

Também foram destaque nas marchas a grande quantidade de coloridas expressões culturais: pequenas representações da violência, música e dança.

domingo, 9 de março de 2008

“Seria o narcotráfico tão pouco rentável?” – as contradições da mídia sobre a Colômbia

Os últimos acontecimentos na Colômbia, o tratamento dado pela imprensa de massas e as acusações feitas por Uribe e seus porta-vozes na mídia, despertam a pergunta: “seria o narcotráfico tão pouco, ou nada rentável assim?”.

Não fosse o fato de Uribe, conhecido no Cartel de Medelin, do qual sempre foi membro, juntamente com sua família, ter feito fortuna com o tráfico, a resposta aparente para essa pergunta seria um “sim”.

As acusações da “Grande Mídia” e dos poderosos colombianos contra as FARC, são do envolvimento e comando da guerrilha sobre o negócio do narcotráfico internacional, negócio que fatura bilhões todos os anos.

Reconhecidamente, a Colômbia é o maior produtor mundial de cocaína, responsável pelo abastecimento do mercado estadunidense e europeu, visto que quase a totalidade da produção da Bolívia é legalizada e destinada ao abastecimento da indústria de bebidas (Coca-Cola e Pepsi), além da indústria farmacêutica mundial.

Estima-se, nos Estados Unidos, que o negócio das drogas, com destaque absoluto para a cocaína, esteja entre os 50 maiores negócios do mundo, em termo de movimentação financeira.

Todos esses fatores, por si só, levam a imaginar que, em se acreditando nas acusações que a “Grande Mídia”, Uribe e sua turma fazem às FARC, a guerrilha seja uma grande potência econômica, com os cofres forrados de dólares e seus líderes acumulando um patrimônio incalculável.

Como paradigma dessa análise, podemos tomar o caso de Abadia, mega-traficante colombiano preso no Brasil, cuja fortuna calculada ultrapassa o limite do imaginável, tendo o patrimônio formado por toda sorte de negócios e bens possíveis, além de sua fantástica capacidade que chegava ao ponto de construir submarinos próprios para o transporte de drogas.

Entretanto, na contramão de tais acusações contra as FARC, temos os fatos apresentados, a realidade que teima em aparecer, mesmo nos discursos oficiais daqueles que fazem as acusações.

Raúl Reyes, apontado como o número 2 das FARC, foi assassinado em um acampamento improvisado em meio à selva, sem quaisquer itens de conforto ou luxo. Tratava-se do segundo na linha de comando em uma organização cujos detratores apontam como proprietária do negócio multimilionário.

Onde estará a fortuna acumulada com o negócio das drogas? Por que o homem que comandava o negócio tão rentável estaria vivendo em condições precárias em meio à selva? Onde teria ido parar os tantos itens de riqueza que os acusadores sempre apontaram?

Pode algum defensor do regime narco-fascista reinante no país apontar que estaria Reyes em tal situação apenas em razão de sua necessidade de se esconder do governo. Entretanto, em nenhum caso conhecido na história, a necessidade de se esconder impediu que os criminosos usufruíssem da fortuna amealhada na prática criminosa, pelo contrário, lembre-se da ostentação de Pablo Escobar, ou mesmo do caso daquele que tomamos como paradigma, Abadia, que permaneceu levando sua vida de milionário na Colômbia até o momento em que sua popularidade entre os demais chefes criminosos caiu.

Mas o caso não se encerra aí.

As FARC ficaram famosas em todo o mundo justamente pelo fato de jamais esconderem os rostos, por falarem abertamente de seus métodos, de suas formas de luta e suas formas de manutenção. Sempre falaram abertamente sobre a cobrança de impostos sobre grandes fortunas, como também da sanção de reclusão aplicada aos sonegadores. A esse último, a imprensa aponta como sendo seqüestros. Assim sendo, qual problema teria as FARC em assumir a prática do narcotráfico caso o praticasse?

E o caso de Reyes acrescenta mais um elemento para a análise: as acusações contra Rafael Correa e Hugo Chávez de sustentarem a guerrilha com vultuosas contribuições.

Ora, se as FARC comandam um negócio que movimenta quantias quase superiores a metade do PIB desses países, que necessidade ou utilidade teria para as FARC contribuições desse tipo?

E note-se que a acusação feita contra os dois presidentes é aquela do caso que ficou conhecido como dos “computadores antimísseis colombianos”, por quão ridícula é a tese de que computadores tenham passado intactos a um ataque com bombas cluster.

Vamos acrescentar ao nosso caso, a acusação de que as FARC, no ano de 2002, teriam contribuído ilegalmente com 4 milhões de reais para a campanha presidencial de Lula. A acusação foi feita por inúmeros órgãos de imprensa do Brasil e estrangeiros, tentando vincular Lula às FARC, as FARC ao narcotráfico, assim podendo conquistar um distanciamento definitivo entre Lula e PT, em relação às FARC.

Pois bem, temos que, segundo as acusações que são feitas pelas mesmas pessoas sempre, as FARC são um grupo de traficantes que não conseguem se manter com o dinheiro do tráfico, que parece ser pouco lucrativo. Assim as FARC precisam de dinheiro vindo de outros países da América Latina, de forma ilegal, para garantir sua manutenção. Ao mesmo tempo, as FARC dispõe de 4 milhões para dar como contribuição para uma campanha eleitoral no exterior, mostrando que tem grande capacidade econômica. E tudo isso acontece enquanto seus dirigentes vivem em acampamentos improvisados, em meio à selva, sem qualquer condição de conforto ou bens próprios.

Se esses elementos não são suficientes, vamos acrescentar as declarações dos prisioneiros das FARC libertados recentemente.

Os prisioneiros fizeram duras críticas às condições em que foram mantidos durante o período de cárcere. Reclamaram, sobretudo, as condições de alojamento e de alimentação, além de cuidados básicos com a saúde.

No entanto, os próprios libertados apontaram que, apesar de suas reclamações, suas condições de alojamento, quando não estavam em deslocamento, eram quase iguais às dos guerrilheiros e dirigentes guerrilheiros, assim como sua alimentação era exatamente a mesma.

Podemos concluir disso, que o negócio do tráfico internacional de drogas é um dos menos rentáveis, com lucratividade inferior a qualquer plantação de batatas, ou coisa que o valha.

Podemos também concluir que os líderes das FARC são um incrível grupo de masoquistas, dedicados a se empenhar na atividade econômica menos rentável e mais reprimida que puderem encontrar. Ou então são masoquistas porque a atividade lhes rende muito, mas eles, por opção própria, preferem viver em condições precárias, talvez para garantir uma boa acumulação de dinheiro e propriedades para o pós morte, pois não usufruem dos recursos em vida.

Um último elemento que podemos acrescentar à nossa análise, é essa nova alegação dos narcos que comandam a política e o Estado colombiano, para tentarem convencer o mundo de que estão enfraquecendo as FARC.

No episódio do assassinato sob encomenda de Ríos, o discurso ensaiado do pistoleiro contratado por 5 milhões, foi de que cometera o crime, a emboscada e traição, por não suportar as condições em que estava, até mesmo com falta de alimentos.

Note-se: um “chefe do tráfico”, juntamente com os seus “capangas”, que “atuariam na prática do tráfico”, atividade que movimenta bilhões ao ano na Colômbia, não dispunham sequer de alimentação adequada e suficiente.

Acredito não precisar apontar mais qualquer argumento, pois a constatação da mentira é óbvia, ululante, exageradamente clara: as acusações que se fazem contra as FARC são falsas, pois são contradições insuperáveis dentro do discurso dos próprios acusadores. Não se precisou aqui recorrer a qualquer argumento trazido pelo campo que defende a guerrilha, mas apenas de seus detratores. Sequer precisaremos lembrar que Uribe foi funcionário dos mais fiéis de Escobar, chefe do cartel de Medelín, o qual, segundo seus assessores mais diretos e até sua noiva, tinha em Uribe um dos mais competentes e fiéis executores das atividades de sua quadrilha. Nem precisaremos lembrar que o primo de Escobar, seu braço direito nos tempos do Cartel, é hoje o Conselheiro Presidencial.

A realidade demonstra, de forma cabal, que além de falsas e mentirosas, as acusações contra as FARC são obra da mais absoluta incompetência, de quem não consegue ser minimamente coerente em suas armações.

As mentiras contadas pelo narco-fascismo, através da imprensa dominad pelo crime e pelos grandes grupos econômicos, não se sustenta diante de seus próprios argumentos. E o mais triste é ver que pessoas ditas de boa fé, ainda compram tais contos da carochinha como suas verdades absolutas.

sábado, 8 de março de 2008

A pistolagem institucionalizada na Colômbia

O crime de pistolagem figura entre os mais repudiados por toda a humanidade nos tempos atuais. Os assassinatos encomendados, executados por pagas em dinheiro, estão entre as condutas mais desaprovadas, em todas as legislações do mundo, como também contam com o repudio de qualquer que se diga minimamente civilizado, até mesmo entre as culturas de povos originários.

A pistolagem institucionalizada teve seu lugar em territórios sem lei, sem um mínimo de civilidade, como no período de colonização dos EUA, ou em sua conhecidíssima corrida do ouro e colonização do meio-oeste. Era conhecida como a época das recompensas, em que os assassinatos eram plenamente aceitos, por meras retribuições pecuniárias, sejam estatais ou privadas.

Com o surgimento e universalização de conceitos de civilidade, como os direitos humanos, a consagração da vida, a condenação dos assassinatos, o repúdio aos justiçamentos, a pistolagem foi alçada ao nível de crime bárbaro, tanto da parte do executor do assassinato, mas principalmente de seu mandante, que além do crime contra a vida, da crueldade, tem o caracter da covardia extremada, de quem, além de criminoso, não tem a coragem de enfrentar sua vítima, fazendo uso de expedientes sorrateiros, que levam à uma espécie de precificação da vida, além de impor à vítima uma situação de impossibilitação absoluta de defesa, pois jamais terá como saber quem será seu algoz, sendo sempre vítima de emboscadas.

Não à toa, todas as legislações penais do mundo, inclusive a da terra das recompensas, condenam de forma mais rígida esse tipo de crime contra os seus cidadãos, tratando como agravante o fato de o crime ser cometido por motivo fútil, além de mais um agravante por ser um crime de emboscada e impossibilitando a defesa à vítima.

Mas nos Estados Terroristas, nos Estados fascistas, a civilidade, os direitos humanos, a vida, são coisas descartáveis, ao gosto dos criminosos que tomaram de assalto o poder.

Assim é a Colômbia dos dias de hoje: um Estado narco-fascista, paramilitarizado, onde o crime e o terrorismo imperam de forma absoluta, como uma política de Estado, já arraigada em suas instituições, apesar do forte repúdio de toda a sociedade.

“A vida humana não tem preço”, diz-se há muito, sobretudo nos tempos pós Revolução Francesa, em que os direitos fundamentais do Homem foram finalmente positivados. E diz-se da vida como algo acima de qualquer outro bem que se possa imaginar.

Quanto vale uma vida então?

Na Colômbia, nos tempos atuais, uma vida pode ser o preço da verdade, como também pode valer algum dinheiro qualquer, que varia de alguns milhares de dólares, até alguns milhões. Essa é a forma pela qual o narco-fascismo trata a vida.

Iván Rios, comandante das FARC, foi a mais recente vítima desse tipo de pistolagem, de crime institucionalizado.

5 milhões seria o preço de sua vida, o preço de uma vida humana.

Arquitetada desde Washington, a política terrorista de Estado da Colômbia é direta em sua execução: oferece dinheiro pelo assassinato daqueles que ousam lutar contra o Estado terrorista. E oferece muito dinheiro, como costumam fazer os mais psicóticos criminosos da história.

Teria sido por dinheiro que um dos discípulos de cristo entregou o símbolo maior da maior religião do mundo, aos seus algozes. E foi por dinheiro que um dos mais bravos lutadores do povo colombiano teve sua vida abreviada, por mais um judas, mais um traidor de seu povo.

O assassino, aplaudido pela psicopatia reinante no Estado colombiano, apresentou-se prontamente para receber sua paga pelo cometimento de um crime encomendado, no que foi prontamente apresentado como uma das crias mais bem acabadas do terrorismo e do crime institucionalizado.

Até que tentou, o governo colombiano, criar uma historinha daquelas que nem as crianças, na mais tenra idade, acreditam, a fim de apresentar o crime bárbaro como ato legítimo, de desespero, de correto. Mas a própria versão apresentada pelos incompetentes executores do terrorismo deixa clara a realidade dos fatos.

Em primeiro lugar, o covarde assassinato de Rios, por emboscada, foi apresentado como resultado de uma “bem sucedida operação militar”. Mas logo veio a verdade, de que um membro de seu grupo, que havia tido contato com os mandantes do crime, foi o real executor da ordem de homicídio.

O facínora, falando de forma pausada e decorada, apresentou, às câmeras de TV, sua versão para o crime. Disse que cometeu a atrocidade movido pelo desespero de estar “cercado”, “isolado”, sem condições sequer de alimentação.

A primeira pergunta que fica acerca de tal desculpa, é a razão de o mesmo ter sido o único que sentiu o peso de tal realidade, dita por ele como “insuportável”.

Mas são os requintes de perversidade do caso que mais chamam a atenção.

O traidor e bandido, não contente em assassinar, à emboscada, o comandante Ríos, pessoa a quem era muito próximo, decidiu cortar-lhe a mão direita, para levar de troféu.

Ora, não fosse o elemento de psicopatia, de perversidade extrema, esse fato já seria, por si, suficiente para demonstrar o caráter de extrema selvageria do ato.

Agora imagine-se e avalie-se a alegação feita: um homem, em ato de desespero, decide assassinar, à emboscada, pessoa que o tinha na máxima confiança, ceifando-lhe a vida de forma covarde, no que se segue o ato de amputar-lhe a mão, talvez por ato fruto de seu “desespero”, que o impelia a demorar-se mais na execução de seu crime, além de carregar consigo prova de que o cometera, para permitir-se ser apanhado por aqueles que pudessem querer a punição por tal crime.

Não é crível? Pudera, pois não há a mínima possibilidade de veracidade de tais alegações.

Voltemos à primeira versão surgida para o ocorrido, de ser uma operação de inteligência militar.

Operação de inteligência militar, sob coordenação e orientação dos EUA, como é o caso do Plano Colômbia, como publicamente conhecido, consiste, em básico ato de manual, na infiltração e corrupção de membros da organização que se pretende aniquilar. Isso não é novidade.

O executor do crime sob encomenda apresenta feliz da vida, a mão direita de sua vítima, como forma de comprovar que cometera o crime.

Por que razão algum criminoso se disporia a tão grande esforço para provar o cometimento de um crime? Como um criminoso, sem grande nível de instrução e conhecimento, saberia planejar tão frio ato criminoso em minúcias?

Podem alegar os defensores do Terrorismo de Estado na Colômbia, que o criminoso e traidor o fizera para comprovar que cometeu o assassinato e queria deixar a guerrilha. Mas se Uribe diz que garante a segurança daqueles que queiram se “desmobilizar”, seria esse argumento a confissão, a comprovação de que a história de garantias é a mais pura mentira?

Um homem que servia tão fielmente ao trabalho guerrilheiro, ao trabalho político, em meio ao que se chamou de uma “bem sucedida operação militar”, no que havia uma generosa oferta de recompensa.

Temos, por evidente, que não há outra possibilidade, senão a certeza de que o traidor e assassino foi diretamente contatado e contratado para a execução do crime, como um pistoleiro comum, que depois cumprira sua parte em um contrato de 5 milhões de dólares. Para os defensores do livre mercado, apenas uma “troca voluntária”.

Note-se que a forma de comprovação do “serviço feito” é de nível tal, que só exigido em tempos remotos, como na idade média, em que as guerras privadas movidas economicamente, gozavam de um “status” de “legitimidade”. A mão amputada, mais documentos, para se comprovar o sucesso da missão contratada.

No dia seguinte à manifestação que mobilizou milhões na Colômbia, mais milhões em todo o mundo, todos pedindo por paz, todos pedindo o fim do Terrorismo de Estado na Colômbia, o narco-fascismo de Uribe dá sua resposta, promovendo a guerra, promovendo o crime, promovendo a institucionalização da pistolagem.

Agora que o assassino traidor, covarde bandido, não acredite que o seu sucesso está completo, pois ainda há o povo colombiano, ainda há o Estado criminoso enlouquecido por lhe dar as costas e trair o compromisso assumido e contratado.

quarta-feira, 5 de março de 2008

É por isso que marchamos nesse 06 de março

ANNCOL - Brasil

São mais de 43 anos do conflito colombiano, que nasceu de uma tentativa de massacrar camponeses que apenas lutavam contra grilagens, execuções sumárias promovidas por latifundiários, por uma reforma agrária. São 43 anos em que o povo colombiano vem sendo sistematicamente massacrado por governos criminosos e narco-paramilitares que controlam esse Estado.

São mais de 43 anos em que a Colômbia viu mais de 1 milhão dos filhos dessa pátria sendo deslocados forçosamente. Mais de 300 mil filhos dessa pátria assassinados de forma brutal, tão somente porque ousaram levantar a voz contra a opressão.

Nesses mais de 43 anos, o povo colombiano mostrou toda a sua fibra e coragem. Seja por meio daqueles que se levantaram em armas para combater os que antes os assassinavam sem obstáculos, seja pela coragem daqueles que buscaram nos sindicatos e nos movimentos populares, sua forma de resistência, ainda que sob os constantes atentados e mortes que se tornaram rotineiras.

Apenas nessa década, apenas sob o regime de Álvaro Uribe, o narco-paramilitar chefe da Casa de Nariño, a Colômbia já contabiliza mais de 520 sindicalistas executados e mais de 120 jornalistas assassinados.

Apesar de todos os crimes praticados por aqueles que controlam o Estado colombiano, gerenciando os interesses do narcotráfico sob as ordens estadunidenses, o povo colombiano, há muito, clama por paz, pede por uma saída política para o conflito. E nesse caminho de paz, seguiram as FARC, incessantemente pedindo por negociações de paz e um intercâmbio humanitário de prisioneiros de guerra.

Foram 6 prisioneiros libertados pela guerrilha apenas neste início de ano, sem que qualquer gesto de colaboração com a paz surgisse por parte do narco-governo.

Mesmo na última semana, foram mais 4 prisioneiros de guerra libertados unilateralmente, sem que o regime narco-fascista assinalasse com qualquer possibilidade de um processo de paz, pelo contrário.

Às vozes que há muito clamam por paz, juntaram-se os libertados, que apontavam a necessidade de uma saída política para o conflito, pois compreenderam a realidade de seu país. No mesmo rumo, há muito, estão as vozes daqueles que continuam presos, aguardando a boa vontade de um governo psicótico, sedento por sangue.

As FARC libertaram prisioneiros e pediram uma negociação de paz. O governo narco-fascista de Uribe respondeu com a execução, a bombas, do negociador de paz da guerrilha, no mesmo ato em que declarou guerra a todo o continente latino-americano, bombardeando um país vizinho.

A execução de Raúl Reyes, em território do Equador, por meio de um bombardeio aéreo, é bastante significativa.

Uribhitler não aceita, sob qualquer hipótese, a paz na Colômbia, pois deseja a guerra, lucra com a guerra, tem ódio de seu povo e de todo o povo latino-americano. Uribe quer a guerra, não só na Colômbia, mas quer a guerra se espalhando pelo continente, sem vacilar em atacar os países vizinhos, sendo hoje a maior ameaça à segurança e à paz no continente. Uribe não aceita a libertação dos prisioneiros, pois os quer todos mortos, pelas armas do próprio exército que comanda, assim como fez com os 11 deputados do Valle del Cauca.

No entanto, o mais significativo deste episódio, é que o narco-fascista-paramilitar, Uribe Vélez, não poderia se contentar simplesmente em executar, de forma covarde a um dos dirigentes das FARC. Uribe precisava, para demonstrar de forma definitiva que não aceita a paz, assassinar exatamente o negociador de paz da guerrilha, para pôr fim a qualquer possibilidade de negociação, mesmo com outros países.

Diante dessa realidade, mais do que nunca, se faz necessária a mobilização e a pressão mundial contra a política terrorista, criminosa e assassina do governo colombiano.

É imperioso que todos os governos democráticos do mundo, a começar pelo Brasil, encerrem todas as suas relações com esse governo terrorista de Uribe Vélez, condenando sua política de execuções e sua declaração de guerra contra um país vizinho, que põe sob ameaça toda a região.

É preciso reconhecer que paz se tornou impossível sob o regime fascista que controla a Colômbia. E torna-se necessário impor o fim imediato e antecipado do governo assassino e narco-paramilitar de Uribe, para que o caminho da paz se abra na Colômbia, também permitindo a volta da convivência amistosa entre as nações soberanas da região.

Nós gritamos pela vida, eles comemoram a morte.

Nós pedimos por paz, eles fazem a guerra.

É por isso que marchamos.

É por isso que lutamos.

É por isso que a Colômbia e o mundo se mobilizam.

Pelo fim do Terrorismo de Estado!

Pelo fim do regime narco-paramilitar-fascista de Uribe!

Chega de massacres!

Chega de Guerra!

Pela paz!

segunda-feira, 3 de março de 2008

O comandante do povo

Manuela Rodriguez/Rádio Café Stéreo


O revolucionário Raúl Reyes foi forjado na luta cotidiana de sua cidade natal, La Plata, departamento de Huila, primeiro como dirigente da Juventude Comunista, e logo no seio do Comitê Central do Partido Comunista Colombiano, de onde participou da campanha de criação da União Patriótica, como militante do Partido Comunista Colombiano.

Ao receber a notícia dos assassinatos de líderes comunistas e da União Patriótica, Raúl Reyes se transfere para as montanhas da Colômbia nos anos 1980, onde tem um ativo papel na luta dos camponeses, se destacou como negociador das FARC durante os diálogos de paz com o governo de Andrés Pastrana entre 1998 e 2002; durante esse processo, Reyes participou, junto com outros membros da guerrilha, de uma longa volta por vários países europeus. Era uma das figuras mais emblemáticas das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – Exército do Povo (FARC – EP) junto com Manuel Marulanda Vélez, Gillermo Cano, o mono Jojoy, Iván Marquez, etc. Era conhecido como o COMANDANTE DO POVO.

Ele mesmo foi o mais claro exemplo desta concepção revolucionária. Mediante e leitura disciplinada, o estudo e sua experiência guerrilheira, se fez um grande autodidata e conhecedor dos princípios do marxismo-leninismo, os quais utilizou de forma criativa para interpretar nossa complexa realidade e dotar as FARC-EP de uma certa orientação revolucionária, que serviria de guia para adiantar as transformações sociais que com urgência reclamam o país. Este conhecimento da realidade colombiana foi vertido durante anos em seus cursos de filosofia marxista e de economia política, mostrando ainda, suas qualidades de educador.

O Comandante Raúl Reyes era muito querido por sua humildade, sinceridade e sorriso franco, comparando-se por alguns sua popularidade à do chefe revolucionário Manuel Marulanda Vélez.

Mas na idéia de construir uma grande pátria com paz e justiça social, na mente imaginativa do comandante Raúl Reyes, sempre brotaram sonhos permanentes de luta. E assim como propicia o reencontro guerrilheiro com Simon Bolívar, com a vigência de seu pensamento antiimperialista, da unidade latino-americana e da unidade popular. Hoje o espírito destas idéias estão presentes no Movimento Bolivariano pela Nova Colômbia.

Na morte do inesquecível comandante Raúl Reyes, seu pensamento político e exemplo revolucionário estão presentes nos processos de troca em nosso país e em todo o continente.

Agora: Quem é realmente nosso verdaeiro inimigo? ... O gringo que ocupou e segue ocupando nosso território, discrimina, explora, ata nossas mãos e coloniza nossas humilhações, ou o espanhol que acaba semeando suas sementes culturais em nossas terras.

VIVA O COMANDANTE RAÚL REYES

domingo, 2 de março de 2008

Uribe pode ter assassinado Ingrid Bettancourt.

Como todos sabem, as FARC, por questões de logística e segurança dos prisioneiros, procuram separá-los, não mantendo jamais um cativeiro único.

No que se refere à segurança, tal prática se intensificou depois que Uribe, com o assassinato dos 11 deputados do Valle del Cauca, deixou claro que pretende matar todos os prisioneiros para não ter mais qualquer empecilho para o desenvolvimento de sua política terrorista.

Ingrid era, sem dúvida, a prisioneira mais visada, tanto pela repercussão internacional sobre seu caso, como pelas pretensões de Uribe em obter um terceiro mandato, objetivo que poderia se tornar impraticável caso Ingrid fosse libertada e decidisse candidatar-se novamente.

Esse posicionamento de Uribe tornou-se mais claro com as sua recusas em aceitar que as FARC fizessem a libertação, mesmo unilateral, dos prisioneiros, no que tentaram, de todas as formas, impedir a operação Emmanuel, por meio de intensivas operações militares e a intensificação dos habituais bombardeios.

Em razão desses fatores, aliado ao interesse direto de Uribe em ver Ingrid morta, a prisioneira franco-colombiana, conforme relatam os próprios ex-prisioneiros, foi levada para um cativeiro distinto daqueles mais numerosos, em companhia, talvez, de mais um ou dois prisioneiros cuja vida interessa menos a Uribe.

Apesar do caráter itinerante de todos os acampamentos, característica tanto de acampamentos quanto do movimento de guerrilhas, alguns deles se destacam em segurança em razão da natureza de suas atividades não armadas.

Nesse sentido, podemos destacar dois pontos de maior segurança das FARC, que seriam a frente de Marulanda, no Bloco Ocidental, por ser o acampamento sede dos mais numerosos encontros de membros do Estado Maior da guerrilha. De outro lado, a Frente de Reyes, que se destinava às relações internacionais e, não raro, recebia autoridades nacionais, internacionais, veículos de comunicação, dentre outros.

Por certo, o local de maior freqüência de reuniões entre membros do secretariado, inclusive por razões de sobrevivência da organização, não se destinaria a albergar prisioneiros. Assim restaria como local seguro para Ingrid o acampamento de Reyes. Com quem notoriamente Ingrid teve contato por várias vezes.

Vários outros elementos apontam na mesma direção.

Ingrid, segundo contam ex-prisioneiros, estaria bastante debilitada. E a razão de seu frágil estado de saúde seria relacionado a uma profunda depressão, por acreditar que jamais seria libertada, visto as informações sobre a forma como Uribe trata as tentativas de negociação, que ela receberia diariamente.

Sabidamente, o responsável por tais tentativas de estabelecimento de um diálogo seria justamente Reyes. E Ingrid, para ter acesso diário às informações, seria necessário que estivesse no mesmo acampamento em que as informações circulavam diretamente.

Outro fator geográfico alimenta essa quase certeza de que Ingrid estaria no mesmo acampamento que Reyes, pois que por segurança, seria necessário que se estivesse com a mesma em região próxima à fronteira de país cuja orientação do governo não seja a de extermínio de lideranças políticas insurgentes, que favoreçam a saída política para o conflito.

Evidentemente, os países cujas fronteiras teriam tais características seriam Brasil, Venezuela e Equador.

Dentre esses três países, necessário observar que o único cuja fronteira oferece condições de circulação pelo lado colombiano é a do Equador.

Ao norte, com a Venezuela, a região e de controle dos paras, com forte influência das forças armadas e a presença massiva de traficantes, o que torna quase impossível uma circulação segura com prisioneiros pela região.

Já na fronteira com o Brasil, o transporte de drogas é intenso, fazendo com que as FARC tenham inúmeras limitações para evitar combates desnecessários.

Já o sul da Colômbia é área hegemônica das FARC, a única região em que se pode garantir uma maior segurança na circulação com uma prisioneira tão procurada, viva ou morta.

Assim, resta explicada a razão de tal ataque ao acampamento, sobretudo num momento em que Uribe sabia que enfrentaria forte reprovação internacional por seu ato.

Pelas declarações dos recém libertados, a libertação de Uribe era iminente. Portanto tornava-se necessário que Uribe agisse rapidamente exterminando Ingrid. E ao que tudo indica, o fez.

Nas próximas semanas, assim que as comunicações do lado popular tornarem a se ajustar, é quase certo que a notícia seja divulgada, no que Uribe tentará acusar as FARC de terem a matado como represália, o que seria ridículo, bem se sabe.

A essa hora, ao que tudo indica, parece que a possibilidade de paz pode ter morrido, junto com Reyes e Ingrid, cujos corpos foram levados por seus assasinos, segundo o terrorista J.M. Santos, “para evitar que tentassem recuperá-los”.

Raul Reyes, seu grito por justiça continua em nós


Nasceu em meio ao terrorismo. Morreu pelas mãos do terrorismo, sempre lutando por paz.

Foi uma vida dura, desde os tempos de trabalhador comum, nos tempos de sindicalista acostumado a ver seus companheiros assassinados por um Estado fascista, até a vida na selva como um dos homens mais procurados do mundo, apenas por lutar por justiça.

Reyes viu seu companheiro Jaime Pardo Leal, candidato presidencial, ser assassinado por esse mesmo Estado narco-terrorista. E isso foi na primeira tentativa unilateral de paz, quando as FARC deixaram as armas e buscaram atuar apenas politicamente. E Leal foi apenas um, dentre os mais de 5 mil, que foram assassinados. E o querido irmão Raúl Reyes escapou por pouco, por várias vezes, naquela ocasião.

Mataram seus amigos, seus irmãos, seus companheiros e camaradas. Mas não mataram em Reyes os sonhos de paz e justiça social.

Reyes foi o emissário da paz, em mais uma tentativa, no final da década de 1990. Viajou a Europa, buscou acordos, tentou a paz por todos os caminhos possíveis. Reyes assistiu, mais uma vez, o fracasso de seus sonhos de paz.

Nosso querido irmão agora era a voz que clamava por paz. Era a voz que dizia ao assassino dos seus, de forma tão desprendida, que a paz era necessária, que o diálogo não só era possível, como era a única alternativa.

Reyes, após ser a voz que tanto gritava por paz, após ser a voz que tanto anunciou a libertação de prisioneiros, os atos unilaterais em busca de paz, foi a voz que se buscou calar através das bombas e dos tiros, disparados covardemente do alto de aeronaves, típico daqueles que praticam seus crimes escondidos atrás de confortáveis escritórios de luxo.

Reyes foi vítima não só dos criminosos que sacrificam o povo colombiano há mais de 60 anos. O querido irmão Raúl Reyes também foi vítima de sua incessante luta pela paz.

Mas as bombas e tiros que lhe ceifaram tão covardemente a vida, não tiveram a capacidade de calar sua voz, que se faz e fará ouvir em todo o tempo e em todos os lugares em que a injustiça imperar.

Querido amigo e irmão Raúl Reyes, sua luta, seu exemplo, sua voz, continuarão sempre vivos, eternamente em nós.

Não desta tua vida em vão. A liberdade com que sonhaste será realidade. E sua voz ecoará ainda mais e mais, em cada dia, em cada hora, em que nossa luta continuar.

Camarada Raul Reyes! Presente!