Noutro dia, em meio a uma conversa sobre política, numa mesa de bar à beira da calçada, eu apresentava um pouco de minha indignação a alguns amigos e conhecidos dos mais despolitizados que tenho.
Claro, não demorou a surgir aquele a dizer “taí o radical. Não liguem, ele é assim mesmo.”.
“Sim”, eu respondi, sou assim porque vejo as coisas a minha volta.
Também não demorou a surgir aquele a perguntar “nossa, mas por que você é revoltado desse jeito?.
Olhei para os lados e logo avistei na calçada aquele senhor, uns 50 anos ou mais, o corpo bastante minguado, rosto sofrido, pouca saúde, com sua senhora ao lado lhe ajudando com o peso do carrinho de papel. Dentro do carrinho, aquela criança de não mais do que uns 4 anos ,roupas sujas, comendo uma banana que nitidamente havia sido jogada no lixo por algum morador daqueles prédios da região central, apenas por estar madura demais. Evidente, não resisti:
- Aquilo. É aquilo que me causa revolta.
- O que? Aquele vagabundo?
- Vagabundo é você! Quero ver você por mais de doze horas puxando aquele carrinho com dezenas de quilos de papel, procurando seu sustento no lixo, seu safado!
- Calma, foi força de expressão! Mas ele está conseguindo o seu. Você queria o que?
- E aquela criança ali dentro do carrinho?
Antes de fazer essa pergunta, eu pensei nas possibilidades lógicas: “ah, essa criança devia estar em casa. E a essa hora, devia estar brincando e preparando-se para dormir.”. Mas se ela estivesse em casa, sendo que os pais precisavam estar na rua, garantindo o sustento da casa, não tardariam a falar que aqueles pais eram irresponsáveis, que estavam a abandonar a pobre criança, produzindo o típico marginal no futuro. E não tardariam a chamar por um conselho tutelar, a buscar por tirar daqueles pais a guarda de seu filho tão amado.
Outra possibilidade: ah, ele devia pensar mais em sua família, em seu filho. Devia arrumar um emprego, colocar a criança numa creche e a essa hora estar em casa cuidando de sua família”. Mas vaga em creche é fácil assim? E emprego, é fácil? Esse homem, procurando emprego, sem qualificação, que emprego poderia arrumar? Imaginem ele buscando emprego, sem qualificação, com essa expressão desgastada pelo tempo e pelo sofrimento. E com que roupas ele haveria de buscar emprego? Daí, enquanto ele procura em vão pela vaga de emprego tão sonhada, o que sua família haveria de comer? Onde eles poderiam morar?
Mas não, a resposta que ouvi eu não poderia imaginar. Foi mais escrota que minhas idéias mais loucas sobre a mesquinhez humana:
- Ah, ele devia ter pensado melhor antes de sair fazendo filho por aí.
- Seu puto! Então pra você um pobre miserável sequer tem direito a sexo ou a ter filhos! É com isso que eu me revolto! Desgraçado!
Levantei-me, paguei minha conta e fui embora.
Preciso me lembrar que não é apenas pela condição dessa gente que eu me revolto, mas pela estupidez daqueles que fazem com que essa gente continue na mesma condição, com sua burrice e ignorância a perpetuar a miséria e a opressão.
Claro, não demorou a surgir aquele a dizer “taí o radical. Não liguem, ele é assim mesmo.”.
“Sim”, eu respondi, sou assim porque vejo as coisas a minha volta.
Também não demorou a surgir aquele a perguntar “nossa, mas por que você é revoltado desse jeito?.
Olhei para os lados e logo avistei na calçada aquele senhor, uns 50 anos ou mais, o corpo bastante minguado, rosto sofrido, pouca saúde, com sua senhora ao lado lhe ajudando com o peso do carrinho de papel. Dentro do carrinho, aquela criança de não mais do que uns 4 anos ,roupas sujas, comendo uma banana que nitidamente havia sido jogada no lixo por algum morador daqueles prédios da região central, apenas por estar madura demais. Evidente, não resisti:
- Aquilo. É aquilo que me causa revolta.
- O que? Aquele vagabundo?
- Vagabundo é você! Quero ver você por mais de doze horas puxando aquele carrinho com dezenas de quilos de papel, procurando seu sustento no lixo, seu safado!
- Calma, foi força de expressão! Mas ele está conseguindo o seu. Você queria o que?
- E aquela criança ali dentro do carrinho?
Antes de fazer essa pergunta, eu pensei nas possibilidades lógicas: “ah, essa criança devia estar em casa. E a essa hora, devia estar brincando e preparando-se para dormir.”. Mas se ela estivesse em casa, sendo que os pais precisavam estar na rua, garantindo o sustento da casa, não tardariam a falar que aqueles pais eram irresponsáveis, que estavam a abandonar a pobre criança, produzindo o típico marginal no futuro. E não tardariam a chamar por um conselho tutelar, a buscar por tirar daqueles pais a guarda de seu filho tão amado.
Outra possibilidade: ah, ele devia pensar mais em sua família, em seu filho. Devia arrumar um emprego, colocar a criança numa creche e a essa hora estar em casa cuidando de sua família”. Mas vaga em creche é fácil assim? E emprego, é fácil? Esse homem, procurando emprego, sem qualificação, que emprego poderia arrumar? Imaginem ele buscando emprego, sem qualificação, com essa expressão desgastada pelo tempo e pelo sofrimento. E com que roupas ele haveria de buscar emprego? Daí, enquanto ele procura em vão pela vaga de emprego tão sonhada, o que sua família haveria de comer? Onde eles poderiam morar?
Mas não, a resposta que ouvi eu não poderia imaginar. Foi mais escrota que minhas idéias mais loucas sobre a mesquinhez humana:
- Ah, ele devia ter pensado melhor antes de sair fazendo filho por aí.
- Seu puto! Então pra você um pobre miserável sequer tem direito a sexo ou a ter filhos! É com isso que eu me revolto! Desgraçado!
Levantei-me, paguei minha conta e fui embora.
Preciso me lembrar que não é apenas pela condição dessa gente que eu me revolto, mas pela estupidez daqueles que fazem com que essa gente continue na mesma condição, com sua burrice e ignorância a perpetuar a miséria e a opressão.
7 comentários:
Muito bom seu post, Jefferson.
Entendo como você se sente e até como existe uma certa antipatia e desdém por parte dessa gente despolitizada que não quer questionar o meio em que vive e não aceita que outro o lembre disso.
nossa, quantas vezes já entrei nessa discussão com pessoas ditas amigas minhas.
eu tenho uma amiga filiada ao PFL, que mal tem leite e pão dentro de casa, mas é branca descendente de alemães e foi criada com essa mentalidade aí. é foda quando vem de uma educação desde pequeno. nem preciso dizer que ela não gosta de negros (e ela é tão pobre ou mais que muitos por aí).
pobreza espiritual é a pior, mesmo.
E vc faz o que pra mudar isso seu retardado? paga sua conta, cossa o saco e dorme...
Ah, conheço bem essa realidade...
Acontece o que eu chamo de "pobreza congênita": um pai miserável não tem condições de dar uma educação decente pro filho, que tb será miserável e, por sua vez, terá filhos meseráveis... conheço gerações nessa condição.
É um ciclo perverso, imposto pelo capitalismo e pela democracia capenga em que vivemos...
O mais triste é que muitas pessoas acham que há quem viva na miséria por que quer...
Sorte e saúde pra todos - menos pros miseráveis de alma!
Gaviorno, você disse que o sujeito é "despolitizado". Ele não é. Ele é polítizado, mas seu pensamento é o pensamento burguês. Conscientemente ou inconscientemenete ele está defendendo uma classe e não é a dos trabalhadores. Percebe-se que esse sujeito é mais um daqueles que vivem uma vida de ilusão de shopping center. E é assim que os burgueses dominam, não dominam apenas pela força, mas dominam também a cabeça das pessoas - tal qual o sujeito que você conversava.
Postar um comentário